Coordenação pedagógica: mediadora e organizadora do trabalho escolar
Rose Meire da Silva e Oliveira
Mestra em Educação/UnB
Prof.ª Aposentada da SEDF
Integrante do GEPA
A escola de educação básica conta com diversas oportunidades de aprendizagem tanto para os estudantes como para os profissionais da educação que nela atuam. A aprendizagem docente tem início nos cursos de formação de professores, mas é no cotidiano do trabalho escolar que os saberes são consolidados por meio de ações diversas, dentre elas, a coordenação pedagógica. Nesse espaço interagem docentes provenientes de diferentes cursos de formação, portadores de experiências variadas e que se responsabilizam pelos diversos componentes curriculares. A sua articulação se dá por meios variados, mas um deles, a coordenação pedagógica, constitui oportunidade especial de interlocução. Sua potência consiste na circularidade de saberes que proporciona, por reunir docentes das várias áreas de conhecimento.
Composta pelos professores da escola e seu coordenador pedagógico, a coordenação pedagógica dedica-se a promover ações, estudos e projetos que deem coesão ao trabalho desenvolvido pelo grupo docente, por meio de ações permanentes de planejamento, discussões e estudos, sempre acompanhados da avaliação da sua atuação. Assim concebida, ela constitui oportunidade de formação continuada na escola. Seu formato é delineado no projeto político-pedagógico da instituição.
No Distrito Federal, a Secretaria de Estado de Educação assegura a todos os docentes o direito à coordenação pedagógica dada a sua relevância para o trabalho escolar. O documento “Orientação Pedagógica: Projeto político-pedagógico e coordenação pedagógica nas escolas” (SEEDF, 2014b) afirma que os momentos destinados à coordenação não somente fomentam reflexões coletivas sobre a prática pedagógica, como evitam ações isoladas, contribuindo para a (re)construção, acompanhamento e avaliação do Projeto Político-Pedagógico (PPP).
Nesse sentido, coordenação pedagógica configura-se como um espaço estratégico na dinâmica escolar. É o “coração pulsante” da escola e ao mesmo tempo um “farol crítico” responsável por múltiplas atividades e catalisadora de decisões coletivas ao fomentar práticas colaborativas entre os sujeitos envolvidos na prática educativa. Dela emanam ideias, estudos, planejamentos, avaliações e o estabelecimento de vínculos profissionais que alimentam e oxigenam o projeto educativo da instituição. Sua atuação é, portanto, vital para garantir a coerência entre planejamento, execução e avaliação das ações pedagógicas.
Este caderno pedagógico tem a intenção de analisar os objetivos e contribuições da coordenação pedagógica, sua articulação com o conselho de classe, seu compromisso com os três níveis de avaliação: das aprendizagens, do trabalho pedagógico da escola e a avaliação em larga escala, sua relação com o Projeto político-pedagógico da escola, assim como a importância do coordenador pedagógico para a organização do trabalho da escola e da sala de aula.
Coordenação Pedagógica: o coração pulsante da escola
Considerada o “coração pulsante” da escola, a metáfora evidencia não apenas a centralidade da coordenação pedagógica como estratégica para a organização do trabalho escolar, mas também, a promoção e articulação dos processos formativos, didáticos e avaliativos que sustentam a qualidade do ensino ofertado aos estudantes, potencializando as aprendizagens. De acordo com o Currículo em Movimento do Distrito Federal (2014),
O espaço e tempo da coordenação pedagógica quando organizados coletivamente possibilitam a reflexão e análise do fazer pedagógico visando o seu aperfeiçoamento. Somente por meio do acompanhamento e avaliação sistemática da prática pedagógica, a partir da teoria que a orienta, será possível a superação dos obstáculos que se apresentam cotidianamente na escola. (DISTRITO FEDERAL, 2014a, p. 21)
Essa centralidade é reforçada à medida que, progressivamente, a coordenação pedagógica tem assumido um papel estratégico, indo além das atribuições técnico-administrativas tradicionalmente associadas à sua função. Conforme destaca Veiga (2007), trata-se de uma função mediadora, que articula os diferentes sujeitos e saberes envolvidos no processo educativo, ressignificando espaços de diálogo, escuta, reflexão e tomada de decisões coletivas e de alinhamentos necessários à organização do trabalho pedagógico, contribuindo para o desenvolvimento profissional contínuo dos docentes.
Diversas são as contribuições da coordenação pedagógica. Vejamos:
- Consolida práticas de gestão democrática. A coordenação pedagógica é um dos espaços privilegiados para a organização do trabalho pedagógico da escola, com a participação de todos os que nele se envolvem. Tal intento exige esforço coletivo, como também, vontade política e pedagógica dos seus participantes para refletirem sobre a função da escola, criarem e consolidarem práticas participativas e democráticas na tomada de decisões, considerando o Projeto Político-Pedagógico (PPP) da escola.
- Promove discussão sobre documentos institucionais. Uma das lacunas da profissão docente consiste na escassez de conhecimento em relação ao que fundamenta, organiza, legitima e autoriza o funcionamento das instituições. Para diminuir a distância entre os documentos norteadores e a ação escolar, a discussão sobre esses instrumentos funciona como orientação para a construção/reconstrução e implementação do PPP; recomposição de aprendizagens, proposta curricular, dentre outros.
- Articula os diferentes sujeitos/segmentos da Escola. A coordenação pedagógica atua como elo articuladorentre gestão escolar, professores e outros profissionais da escola, estudantes e famílias, possibilitando o diálogo entre esses segmentos. Temáticas de interesse de todos e que venham contribuir para as aprendizagens dos estudantes e melhor entendimento pelos servidores e pais/responsáveis quanto à organização do trabalho da escola e da sala de aula podem ajudar na construção de uma cultura escolar colaborativa e democrática. Promover encontros e rodas de conversa para fortalecer vínculos entre escola e família pode ser uma boa ideia!
- Oportuniza a socialização de atividades desenvolvidas pelos professores e compartilha ações exitosas do trabalho docente, valorizando o empenho e esforço de cada um.
- Organiza, acompanha e facilita a construção coletiva de decisões e práticas pedagógicas, estimulando um ambiente colaborativo entre os docentes. Assim compreendida, a coordenação pedagógica se concretiza em ações de planejamento coletivo, quando os professores se reúnem para alinhar objetivos, discutir metodologias e construir sequências didáticas integradas, considerando as disciplinas/áreas de conhecimento. É nesse espaço que o trabalho escolar ganha coerência e intencionalidade para organizar as intervenções pedagógicas, conforme as necessidades de aprendizagem apresentadas pelos estudantes, inclusive para os que apresentam necessidades especiais.
- Impulsiona a cultura escolar ao promover projetos interdisciplinares, articulando os diferentes segmentos da escola. Sua atuação é marcada pela sensibilidade, pela visão sistêmica e orgânica da escola, sendo necessária a busca constante por práticas inclusivas e eficazes. Desse modo, valoriza-se a cultura do pertencimento, sensível às necessidades dos sujeitos, reconhecendo que cada um tem seu lugar e valor dentro do contexto escolar.
- Promove estudos e discussões sobre o processo avaliativo. Porcompreender a necessidade permanente de consolidação e aprofundamento das aprendizagens dos estudantes, a coordenação pedagógica proporciona estudos e reflexões sobre as funções da avaliação, com destaque para a avaliação formativa dos estudantes. Pelo diálogo com seus pares os docentes desenvolvem os melhores meios de avaliar as aprendizagens dos estudantes, de se autoavaliarem e de avaliarem o trabalho pedagógico da instituição.
- Promove a formação continuada dos professores. É no cotidiano do trabalho escolar que se revela e materializa o “pulsar” pedagógico. Oficinas, grupos de leitura e estudos coletivos são promovidos para o avanço da prática docente, problematizando e aproximando teoria e prática, haja vista que “a capacidade de questionamento e de autoquestionamento é pressuposto para a reflexão, que não existe isolada, mas num processo de procura que se dá no questionamento entre o que se pensa, a teoria que orienta a prática e o que se faz, ou seja, a própria prática” (Silva, 2007). Convites a especialistas são bem-vindos para abordar temas indicados pelos próprios docentes. Criação de espaços para compartilhamento de saberes entre os professores, como cafés pedagógicos ou rodas de conversa podem ser viabilizados. Logo, a coordenação, na figura do coordenador(a) pedagógico(a),atua como articuladora e mediadora do conhecimento, incentivando a autonomia docente a partir de estudos e da revisão de práticas de forma crítica e consciente.
- Acompanhamento pedagógico. A coordenação pedagógica necessita manter-se informada sobre o desempenho dos estudantes por meios variados: relatórios descritivos, resultados de avaliação diagnóstica realizada pelos professores, informações coletadas por ocasião dos conselhos de classe, resultados de avaliação externa. Assim, cabe à coordenação pedagógica manter organizadas informações sobre o desempenho dos estudantes, provenientes de diversos meios. Tudo isso é considerado para o planejamento de intervenções pedagógicas ao longo de todo o ano letivo.
- Inovação e Transformação pedagógica: a coordenação pedagógica constituiespaço de discussão sobre o uso de novas metodologias, tecnologias e abordagens inclusivas que promovam as aprendizagens de todos os estudantes. Além disso, incentiva práticas pedagógicas inovadoras como sala de aula invertida, projetos e gamificação, incentivo ao uso de tecnologias educacionais ou criação de espaços de aprendizagem diferenciados. A coordenação pedagógica que se vislumbra reafirma seu papel como espaço tempo de transformação da ação educativa que compõe e recompõe as aprendizagens continuamente de modo a garantir a incorporação de aprendizagens pelos estudantes e pelos profissionais que com eles interagem. Garantir o direito às aprendizagens pelos estudantes requer, ao mesmo tempo, oferecer aos professores as possibilidades de eles recomporem seus saberes continuamente.
A práxis transformadora do(a) coordenador(a) pedagógico(a): entre o acolhimento e a ação
Dedicar esforços à formação e ao reconhecimento do trabalho do coordenador pedagógico significa investir na qualidade da educação. Ao mesmo tempo em que “acolhe e engendra, ele deve ser questionador, desequilibrador, provocador, animando e disponibilizando subsídios que permitam o crescimento do grupo” (Vasconcellos, 2019, p. 132). O mesmo autor esclarece que, em função do espaço em que atua, “tem tanto a interface com o ‘chão da sala de aula’ (através do contato com os professores e alunos), quanto com a administração, podendo ajudar uns e outros a se aproximarem criticamente” (p. 132). Sendo assim, a coordenação pedagógica não apenas organiza o trabalho escolar e o da sala de aula, mas o reinventa, mantendo a escola viva, pulsante e em constante movimento.
Essa dinâmica exige que o coordenador pedagógicomais do que supervisionar o trabalho docente atue como agente formador, que inspira e orienta os professores na busca por estratégias mais eficazes de ensino e de aprendizagem, fortalecendo a implementação de ações de formação continuada com foco na melhoria da prática docente, na formação integral dos estudantes e nas aprendizagens de todos os sujeitos envolvidos. Assim, o coordenador promove interlocução privilegiada com o professor, afirma Vasconcellos, “pelo fato de se colocar em efetiva atitude de escuta, de diálogo” (2019, p. 147). Completa o mesmo autor: “a referência, o pano de fundo do diálogo deve ser o Projeto Político-Pedagógico (p. 147).
Conhecedor das fragilidades do grupo de professores, o coordenador pedagógico atua apontando “possíveis caminhos para a construção de novos saberes ou para a ressignificação de conhecimentos já existentes” (Silva; Fávero, 2022, p. 28). Embora ocupe um lugar técnico e de especialista, ele coloca-se de “forma colaborativa ao lado do seu grupo de professores, tornando a escuta atenta, desenvolvendo diálogos compreensivos, acolhendo as angústias”. Contudo, a atuação do coordenador pedagógico não pode consistir em “apagar incêndios pedagógicos”, expressão usada por Silva e Fávero (2022, p. 29).
Em resumo, a práxis do(a) coordenador(a) envolve a escuta ativa e sensível, o apoio emocional, o acolhimento e a orientação aos professores, seja na superação dos dilemas surgidos no início da carreira docente, nos momentos de insegurança, frustrações e ansiedades decorrentes pela falta de experiência na profissão e até mesmo a desmotivação profissional.
Caldart ensina que “acolher o ser humano que adentra a escola, considerando cada pessoa como um ser em formação, como humanidade que se constitui e se restitui, é tarefa educativa essencial” (2023, p. 65). O(A) coordenador(a) pedagógico(a) torna-se figura que, necessariamente, exerce essa função pois lida com a formação humana e, ao se colocar no lugar do outro, o acolhe na sua singularidade.
Logo, o trabalho docente “é essencialmente coletivo, uma vez que é realizado em um contexto em que vários outros sujeitos se fazem presentes, influenciam histórias de vida e são influenciados por elas, pelos valores, concepções, saberes e fazeres uns dos outros” (Silva, 2007, p. 142). Ao promover e participar desse processo o(a) coordenador(a) pedagógico(a) garante um ambiente saudável, ético e respeitoso.
Uma outra frente de atuação do(a) coordenador(a) é o acompanhamento e apreciação do trabalho docente. Isso se dará por meio de feedbacks bem-intencionados e construtivos com informações relevantes para o aprimoramento do fazer pedagógico oferecidos pelo(a) coordenador(a) e pelos próprios professores sobre a atuação de cada um deles, após observações de aula/atividades desenvolvidas junto aos estudantes, contribuindo para a melhoria do processo de ensino.
A intenção do feedback é ser formativo, condição favorável à incorporação de aprendizagens também pelos docentes. Villas Boas (Caderno Pedagógico Por que falar sobre feedback é tão importante? GEPA, 2025) citando Huston (2022), afirma que “Receber feedback sobre suas aprendizagens não constitui atividade reservada aos estudantes. Docentes de escolas de educação básica também merecem obter apreciação sobre seu desempenho pelo diretor da escola, pelo coordenador pedagógico e pelos colegas […]”, o que amplia o campo de atuação do feedback. Apreciar o trabalho realizado pelos professores em sala de aula com intencionalidade positiva é uma forma de valorizá-los e de estabelecer vínculos baseados na confiança.
Tal postura exige da equipe gestora da instituição compreensão e consciência sobreo trabalho que deve acontecer na coordenação pedagógica, do contrário, o desempenho do(a) coordenador(a) poderá ser enfraquecido e invisibilizado, resultando em inúmeras lacunas e ingerências na coordenação das ações pedagógicas e prejuízos nas dinâmicas relacionais no âmbito escolar.
No entanto, alguns aspectos podem interferir na atuação do(a) coordenador(a) pedagógico(a), dentre eles:
- Sobrecarga de funções administrativas, que muitas vezes desviam o foco do seu trabalho.
- Resistência à mudança, tanto por parte dos professores quanto da própria gestão da escola.
- Falta de tempo para formação docente e planejamento coletivo, dificultando a implementação de práticas inovadoras.
- Escassez de recursos que podem limitar ações mais estruturadas e contínuas.
Para superar tais obstáculos faz-se necessário que o coordenador tenha habilidade organizacional de liderança, empatia, flexibilidade e capacidade de negociação junto ao coletivo e à equipe gestora para cumprir suas tarefas educativas. Caldart (2023, p. 127) afirma que “Não se cria uma cultura, um modo de vida, senão pelo exercício prático continuado de ações e relações que a formam e a atuação intencional sobre a subjetividade que permite internalizá-las como um valor positivo”, percebendo no outro, sejam coordenadores pedagógicos, professores, profissionais da educação, estudantes e respectivos pais/responsáveis, o seu valor como parte substancial na construção de uma cultura escolar ética e humanizada nas relações sociais estabelecidas no interior da escola.
Desafios decorrentes do dia a dia escolar exigem que o(a) coordenador(a) pedagógico(a) amplie sua atuação, desenvolvendo atividades diferenciadas com o grupo de professores, como círculos de estudo e grupos de formação continuada com foco em temas de interesse do coletivo e relevantes para o contexto da escola; oferecimento de feedbacks aos docentes, como forma de apoiar o seu desenvolvimento profissional; projetos interdisciplinares, que favorecem a integração curricular, o trabalho colaborativo entre os pares, por área de conhecimento/disciplina.
Portanto, quando compreendida em sua dimensão formativa, a práxis transformadora do(a) coordenador(a) pedagógico(a) “comporta as dimensões reflexiva, organizativa, conectiva, interventiva e avaliativa” (Vasconcellos, 2004), em especial sua articulação com o Conselho de Classe.
Articulação entre a coordenação pedagógica e o conselho de classe
A política de formação desenvolvida na instituição de ensino, em diversos espaços e momentos, especialmente durante a coordenação pedagógica, contribui para que o conselho de classe, tradicionalmente associado à análise do desempenho dos estudantes, assuma um significado mais abrangente: espaço formativo e privilegiado para o compartilhamento de saberes e experiências acerca das aprendizagens dos estudantes.
Assim sendo, a coordenação pedagógica e conselho de classe constituem atividades que se articulam. Seus participantes costumam ser os mesmos, com exceção dos conselhos de classe dos quais participam os estudantes. É no espaço da coordenação pedagógica que os encontros do conselho de classe são planejados e é na coordenação pedagógica que várias de suas deliberações são atendidas.
Sob a mediação da coordenação pedagógica e equipe gestora, o conselho de classe configura-se como uma instância avaliativa de “mão dupla”, na medida em que promove simultaneamente a análise da continuidade da aprendizagem dos estudantes e reflete sobre as práticas docentes adotadas, evidenciando a interdependência desses dois processos.
É nesse momento que se identificam as necessidades e os desafios que estão impedindo a incorporação de aprendizagens, com o objetivo de superá-los e, se possível, com a participação ativa de todos os envolvidos: equipe gestora, professores, profissionais da educação, família e os próprios estudantes. O Conselho de Classe passa a ser, portanto, instância avaliativa e formativa, voltado para a regulação das aprendizagens com compromisso interventivo e de análise crítica sobre os processos de ensino e de aprendizagem, articulando saberes e sujeitos em torno de um projeto educativo comum (Veiga, 2007), materializado pelo projeto político-pedagógico da escola.
Nesse sentido, o conselho de classe, em articulação com a coordenação pedagógica, desempenha papel essencial ao fomentar análise crítica e consciente sobre o desenvolvimento do trabalho escolar. Ao revisitarem continuamente o processo de ensino-aprendizagem, esses momentos favorecem a elaboração de estratégias colaborativas direcionadas ao enfrentamento das dificuldades e dos desafios identificados, impulsionando ações integradas em prol do sucesso escolar dos estudantes.
Portanto, ambos os espaços se dedicam ao acompanhamento do trabalho docente e das aprendizagens dos estudantes, bem como à reflexão sobre as atividades com e por eles desenvolvidas. Para que esse processo seja significativo, é necessário que o conselho de classe não se resuma a um momento isolado, mas seja uma extensão das ações realizadas durante todo o ano letivo, assegurando a efetivação dos encaminhamentos e reflexões produzidas no âmbito dessa instância avaliativa.
Vale ressaltar que a coordenação pedagógica tem entre suas principais atribuições a promoção da formação continuada e a organização de espaços de reflexão coletiva. Articulado a esse trabalho, o conselho de classe assume função estratégica de avaliação, possibilitando aos educadores analisarem o desempenho dos estudantes e das diferentes turmas, identificando necessidades e propondo as intervenções pedagógicas adequadas a cada situação identificada.
Sendo assim, a articulação entre a coordenação pedagógica e o conselho de classe garante que as discussões e proposições favoreçam a prática das funções diagnóstica e formativa da avaliação. Pela escuta ativa, análise crítica dos dados obtidos por meio da avaliação do trabalho escolar, da sala de aula e em larga escala e construção de propostas pedagógicas, o(a) coordenador(a) pedagógico(a) fortalece o papel do conselho de classe como espaço de tomada de decisões compartilhadas, consolidando a gestão democrática e o compromisso ético com as aprendizagens de estudantes e profissionais da educação.
É a escola se repensando, se avaliando e se reorganizando!
Coordenação pedagógica: compromisso com os três níveis de avaliação
Segundo Luiz Carlos de Freitas et al (2009), a avaliação educacional compreende três níveis interdependentes: avaliação da aprendizagem, avaliação institucional e avaliação do sistema escolar ou redes de ensino. Cada um desses níveis possui finalidades distintas, mas complementares, e a coordenação pedagógica desempenha um papel estratégico na articulação entre eles.
A seguir, propomo-nos, ainda que de forma sucinta, analisar a articulação entre esses três níveis e as ações desenvolvidas pela coordenação pedagógica, considerando que essa relação revela tensões, desafios e possibilidades para a construção de práticas avaliativas democráticas e socialmente comprometidas com as aprendizagens dos estudantes. A análise proveniente desse conjunto de dados oportuniza à escola reorganizar continuamente o seu projeto político-pedagógico.
Avaliação das Aprendizagens
O foco neste nível são as aprendizagens e o acompanhamento do desempenho dos estudantes nas atividades desenvolvidas em sala de aula. A coordenação pedagógica atua como mediadora entre os dados coletados pelos professores e as decisões pedagógicas que impactam diretamente o percurso de aprendizagem dos estudantes.
Essa mediação exige sensibilidade para interpretar os resultados de forma contextualizada e intervir com estratégias que atendam as necessidades de aprendizagem de todos os estudantes. Para isso é fundamental:
Apoiar os docentes na seleção e desenvolvimento dos recursos avaliativos apropriados às diferentes situações de aprendizagem e condizentes com a função formativa da avaliação. É importante ressaltar a necessidade de coerência entre esses recursos e os objetivos estabelecidos para o alcance das aprendizagens; promover a análise, tanto individual como coletiva, das informações obtidas por meio do processo avaliativo, com vistas à reorganização do trabalho pedagógico que garanta a incorporação de aprendizagens por todos os estudantes. Essas informações devem subsidiar o planejamento das intervenções pedagógicas e assegurar que cada função da avaliação – diagnóstica, formativa e somativa – seja devidamente praticada. Ressalta-se que não se admite a adoção de práticas avaliativas de caráter classificatório.
Avaliação Institucional
Neste nível, a atenção volta-se para a escola como organização educativa e para a atuação dos sujeitos que dela fazem parte. Essa avaliação abrange a instituição em sua totalidade: suas dinâmicas internas, estrutura física e organizacional, bem como os modos de organização do trabalho pedagógico, desde o acolhimento do estudante até seu retorno ao ambiente familiar. Com esse intuito, a coordenação pedagógica assume compromisso com a consolidação de uma cultura avaliativa participativa, promovendo constante análise da sua atuação e contribuindo para o repensar do trabalho de toda a escola.
Avaliação do Sistema Escolar ou de Redes de Ensino
Este nível envolve os sistemas educacionais em escala mais ampla (municipal, estadual/ distrital e nacional) e a análise qualitativa dos dados obtidos, tendo como foco o trabalho desenvolvido pelo grupo de escolas. Nesse contexto, a coordenação pedagógica desempenha um papel estratégico ao traduzir os indicadores externos – como os resultados de avaliações em larga escala – em ações pedagógicas que dialoguem com a realidade escolar. Mais do que cumprir metas, trata-se de ressignificar os dados à luz de uma prática comprometida com a equidade, a inclusão e a qualidade social da educação. Com esse propósito a coordenação pedagógica poderá:
- Mediar a leitura e interpretação dos dados externos à escola, como os resultados de avaliações/exames em larga escala, como por exemplo: SIPAEDF (Sistema Permanente de Avaliação Educacional do Distrito Federal); SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica); IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica); ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), entre outros. Os dados obtidos nesses exames devem ser interpretados à luz das singularidades de cada realidade escolar, respeitando suas particularidades históricas, sociais e pedagógicas.
- Converter esses dados em ações pedagógicas efetivas, sem reduzi-los a rankings ou sanções, bem como qualquer deslegitimação do trabalho docente. Isso implica reconhecer os avanços alcançados e identificar, de forma crítica e construtiva, os aspectos frágeis que demandam aprimoramento. Além disso, cabe promover estudo comparado da instituição de ensino com ela própria, tendo em vista revisitar projetos descontinuados ou ações ineficazes, esvaziadas de sentido que dificultam o movimento pedagógico, até mesmo analisar as mudanças ocorridas de um ano para o outro ou de uma gestão escolar/pedagógica para outra.
- Defender postura crítica diante das políticas educacionais avaliativas para assegurar que os resultados obtidos pela avaliação em larga escala contribuam efetivamente para a auto-organização da escola (Caldart, 2023) e para a melhoria da qualidade da educação, em vez de se converterem em mecanismos de controle meritocrático pautados em bonificações, ou mesmo em desprestígio ou abandono por instâncias superiores dentro do sistema escolar da rede de ensino.
A postura crítica frente às políticas avaliativas contribui para que a escola se fortaleça como espaço de transformação social e não de reprodução de desigualdades impostas pelo capitalismo. Nesse cenário, a atuação da coordenação pedagógica torna-se estratégica, especialmente quando articulada ao projeto político-pedagógico da instituição de ensino, que expressa as intenções coletivas, os princípios éticos e as práticas que orientam o fazer pedagógico.
Coordenação pedagógica e o Projeto Político-pedagógico da escola – PPP
A coordenação pedagógica ocupa lugar central no acompanhamento, articulação e consolidação de práticas educativas ao longo do ano letivo que dialogam com os princípios democráticos e com os objetivos expressos no Projeto Político-Pedagógico da escola. Mais do que um documento formal, o PPP representa a síntese das intenções, valores e compromissos assumidos pela comunidade escolar, orientando e organizando o trabalho realizado pela instituição como um todo e, em sentido restrito, pela interação do professor com seus estudantes, seja em sala de aula ou em outros espaços. O PPP assume caráter processual, organizativo e intencional e, por isso, precisa ser constantemente revisitado (Silva, 2007).
Como espaço privilegiado de formação, participação, escuta e diálogo entre os professores da escola, a coordenação pedagógica contribui para a construção/ reconstrução do seu PPP. Nesses momentos eles analisam e avaliam as atividades desenvolvidas e em desenvolvimento, sua interação com os pais e, principalmente, o trabalho desenvolvido com os estudantes, e propõem novas ações. Talvez não seja uma tarefa simples de ser realizada, mas é no dia a dia que se constrói a cultura avaliativa de cada escola.
Assim, o Projeto Político-Pedagógico se desvia do seu caráter burocrático, elaborado para atender às formalidades institucionais, e passa a ser vivenciado como estratégia política e pedagógica e orientadora da construção de uma escola inclusiva e comprometida com a formação e aprendizagens de todos.
Com esse propósito, o coordenador pedagógico, em parceria com a equipe gestora, assegura que o Projeto Político-Pedagógico não se restrinja ao papel, mas se concretize como um ato consciente e político voltado ao bem comum. Juntos mobilizam o coletivo escolar para que as ações pedagógicas estejam alinhadas à função social e aos princípios definidos pela instituição.
Essa perspectiva reforça o entendimento de que a educação é, por natureza, um ato político. Estudioso em temas educacionais, Freitas, em um de seus artigos publicados em setembro deste ano – “A Guerra dos Valores” (01/09/2025, BLOG) – faz referência a Lênin, que afirma ser a educação hipócrita quando desvinculada da política. A partir desse entendimento, conclui-se que educação e política são indissociáveis. Como destaca o autor: “Compreender os projetos políticos é importante porque eles expressam valores que, se assumidos pela educação, determinam suas finalidades, objetivos e a própria organização do trabalho pedagógico” da instituição de ensino.
A partir dessa compreensão, é importante que a escola tenha clareza sobre o tipo de projeto educativo que vem construindo ou executando, muitas vezes, inconscientemente por meio de práticas veladas e destoantes da sua função social. Trata-se de um processo dinâmico que exige escolhas conscientes e decisões estratégicas diante de cada situação vivenciada na e pela própria escola.
Esse processo contínuo de análise coletiva fortalece o alinhamento entre os princípios do PPP, os valores políticos que o sustentam e uma prática pedagógica efetiva pelo engajamento daqueles que acreditam na transformação social pela educação.
Coordenar, avaliar e formar: pilares da prática pedagógica
Intrinsecamente relacionados e materializados no e pelo projeto político-pedagógico da escola, coordenar, avaliar e formar constituem o pilar da prática pedagógica. Discutir e aprofundar os pressupostos que orientam cada uma dessas ações são imprescindíveis para a construção de novas práticas, por meio de um trabalho intenso de cooperação, confiança e de valorização de todos os professores e profissionais da educação. Para tanto, são necessários engajamento e adesão a um projeto educativo construído coletivamente e que viabilize uma nova forma de organização do trabalho da escola para o enfrentamento e superação do fracasso escolar.
Tal atitude permanente e comprometida realizada principalmente no espaço da coordenação pedagógica pode elevar o nível de consciência crítica da equipe escolar, o que, de fato, estabelece uma cultura da necessidade de construção e análise do processo avaliativo e das ações pedagógicas por meio do processo dialógico que consiste no compartilhamento de saberes e vivências que, de forma dinâmica, retomam ideias, teorias, concepções e práticas a partir de cada realidade concebida e vivida.
Segundo Batista (2009, p. 116), a “perspectiva de um trabalho que privilegie a análise da realidade, construindo olhares” e percepções sobre as ações desenvolvidas, incluindo as “dinâmicas de sala de aula, gera um movimento de apreender representações, de explicitá-las”, provocando uma construção coletiva de intencionalidades e de possíveis intervenções a partir do concreto observado.
Nesse sentido, “o coordenador e todos os demais profissionais da educação pensam e transformam suas práticas, construindo percursos de formação no bojo de projetos educativos” (Batista,2009, p. 116), estabelecem vínculos, interações sociais, deixam marcas de suas características subjetivas, se repensam e se transformam em um movimento cíclico de idas e vindas. “Todos esses movimentos de formação são articulados numa trama em que se inscrevem a coordenação e a avaliação” (Idem, p. 117).
Uma vez revestida de significado, a tríade: coordenar, formar e avaliar fortalece o compromisso social e ético com a formação integral dos estudantes, mediando e organizando o trabalho escolar. É semear intencionalidades, nutrir práticas reflexivas e colher transformações que fortalecem a escola como espaço vivo de aprendizagem.
VAMOS À REFLEXÃO!
A coordenação pedagógica ocupa posição estratégica na organização do trabalho da escola, sendo responsável por articular diversas tarefas educativas e garantir a coerência entre planejamento, execução e avaliação das práticas pedagógicas. Sua atuação se concretiza em ações como o planejamento coletivo, a análise de dados educacionais, a formação continuada dos professores e a mediação de conflitos.
Além disso, a coordenação pedagógica promove a integração dos segmentos da escola, fomenta projetos interdisciplinares e incentiva o uso de metodologias inovadoras. Ao assumir esse papel multifacetado torna-se o “coração pulsante” da escola, força vital que impulsiona a aprendizagem, sustenta os vínculos e transforma a cultura escolar. Com base nessas afirmações, propomos a seguinte reflexão:
Você, que atua em escola de educação básica, nela identifica as ações desenvolvidas neste caderno pedagógico? A coordenação pedagógica tem atuado segundo as propostas aqui apresentadas? Em que é necessário avançar?
REFERÊNCIAS
BATISTA, Sylvia Helena Souza da Silva. Coordenar, avaliar, formar: discutindo conjugações possíveis. In: ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (orgs). O Coordenador Pedagógico e o espaço de mudança, 7 ed. Edições Loyola, São Paulo, 2009.
CALDART, Roseli S. Sobre as tarefas educativas da escola e a atualidade. São Paulo: Expressão Popular, 2023.
DISTRITO FEDERAL. Secretaria de Estado de Educação do DF. Currículo em Movimento da Educação Básica: Pressuposto Teóricos. Brasília, 2014a.
DISTRITO FEDERAL (SEEDF). Orientação pedagógica. Projeto político-pedagógico e coordenação pedagógica nas escolas. Brasília- DF, 2014b.
FREITAS, Luiz Carlos de; SORDI, Mara Regina Lemes de; MALAVASI, Maria Márcia Sigrist; FREITAS, Helena Costa Lopes de. Avaliação educacional: caminhando pela contramão. Petrópolis: Vozes, 2009.
FREITAS, Luiz Carlos de. Uma Guerra por valores. Artigo publicado pelo BLOG Avaliação Educacional. Disponível em: https://avaliacaoeducacional.com/2025/09/01/uma-guerra-por-valores/. Acesso em: 13 out. 2025.
SILVA, Edileuza Fernandes. A coordenação pedagógica como espaço de organização do trabalho escolar: o que temos e o que queremos. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro (Org.). Quem sabe faz a hora de construir o projeto político-pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 2007.
SILVA, Ana Carolina Leite da; FÁVERO, Altair, Alberto. Formação continuada e os caminhos de autoformação do coordenador pedagógico. In SARTORI, Jerônimo (org.) Saberes e fazeres da coordenação pedagógica na educação básica. RJ: Autobiografia, 2022.
VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Coordenação do trabalho pedagógico: do projeto político-pedagógico ao cotidiano da sala de aula. São Paulo: Cortez 2019.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Coordenação pedagógica: entre a gestão e a formação. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro (Org.). Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 3. ed. Campinas, SP: Papirus, 2007. p. 111–132.
VILLAS BOAS, Benigna Maria de Freitas. Caderno Pedagógico: Por que falar sobre feedback é importante? Texto publicado em 30 de julho de 2025. Disponível em: https://gepaeducacao.com.br/por-que-falar-sobre-feedback-e-importante/. Acesso em: 07 out. 2025.